É curioso e todo mundo sabe que, de um modo geral, a internet tem se tornado para muitos um território nada saudável, mesmo considerando que o seu uso tem gerado grande aumento do saber humano, sem dúvida alguma. De outro lado, no entanto, é nela que surgiram a desorientação, perda, por exemplo, do sentido conceitual de verdade e desconstrução de saberes centenários – imaginemos que pessoas estão defendendo que a Terra é plana e que vacinas não são importantes, mente-se sobre tudo e para tudo.
Deu-se vazão à intolerância e discurso de ódio, na figura dos trolls (gente que intencionalmente cria confusão na web), e os haters (que propugnam o ódio). É claro que a internet é apenas um meio, as pessoas são suas operadoras, logo elas que são e estão assim. A estranheza, todavia, é que mesmo sabendo disso, pessoas não criam filtros, não duvidam do que leem. As mentiras estão ganhando mais espaço que as verdades – aqui no sentido de auto-evidências. Não falo apenas das fake news, mas das mentiras deliberadas, com intenção não apenas da fraude, do golpe, mas também e certamente, em maior quantidade, de justificar, explicar, corroborar ações, pontos de vista.
As pessoas estão mentindo com naturalidade enfermiça. Não falo apenas dos operadores políticos, mas dos nossos amigos, parentes que não apenas difundem inverdades pela internet, mas criam eles próprios os seus conteúdos de mentira. Infelizmente: vai piorar, não apenas por conta das próximas eleições, mas porque não se tem visto consequência penal alguma, muito pelo contrário, há muito dinheiro em jogo. A história do youtuber-vereador Gabriel Monteiro dá bem a dimensão dessa máquina. Ele inventava, fraudava situações e tudo regado a muita monetização. Estima-se em cerca de quatrocentos mil reais por mês.
Os danos não estão apenas na tal “quem nunca contou uma mentirinha para a namorada?”. Claro que não se trata disso. A questão é saúde física e emocional. É reputação. É suicídio. Já se atribui ao cyberbulling a morte de alguns jovens. De forma alguma, sou contra o avanço da internet. Ele põe, literalmente, na palma de nossas mãos, todo o conhecimento humano desde sempre. Falo do território sem leis, onde pessoas se permitem de tudo e estão migrando seus conceitos e feitos para o mundo real. O paralelo virou o modelo e incentivador para o real. Claro que o problema, repito, não está na tecnologia, mas estamos perdendo a noção de ser e de interagir, pois criamos avatares, idealizamos comportamentos e mentimos muito. Estamos adoecendo e não nos damos conta. Estamos nos transformando em uma sociedade de nomophobia: ansiedade por não estarmos conectados a um dispositivo móvel.