O processo de eleição para comandar a Associação dos Delegados da Polícia Federal (ADPF) expôs uma grave crítica interna dos integrantes da corporação às rédeas curtas impostas pelo governo Dilma Rousseff nos gastos com diárias e passagens em todos os ministérios. Delegados, agentes e peritos temem que operações policiais estejam sendo monitoradas, ainda que indiretamente, pelo Ministério da Justiça, por meio de um decreto presidencial que exige o aval de José Eduardo Cardozo para serem concedidas diárias para viagens.
O Decreto 7.689/12, baixado pela presidente Dilma no passado, limitou os gastos com diárias e passagens, principalmente para o exterior, em todo o Poder Executivo. Para despesas que envolvam mais de dez pessoas, por exemplo, é necessária a autorização do ministro da área. Pagar mais de dez dias de serviço fora para um mesmo servidor? Só com o chefe da pasta. Só ele pode autorizar viagens ao exterior ou o gasto de mais de 40 diárias intercaladas no período de um ano. Se houver necessidade de sigilo, essa autorização poderá ou não ser delegada a chefes de menor escalão.
O Ministério da Justiça e o Ministério do Planejamento negam vazamentos. A assessoria da PF disse que os pedidos de autorização são feito “de forma genérica” e sem revelar a “natureza” das viagens.
Mas a suspeita de monitoramento não se resume aos delegados. Agentes também acreditam que o governo possa usar esse mecanismo financeiro para se informar sobre onde estão ocorrendo investigações e tentar prever datas de operações e nome dos alvos da PF. “É uma situação muito complicada, pois há a possibilidade de controle dos locais da ação. Aumenta o risco de vazamento”, diz o escrivão Flávio Werneck, diretor da Federação Nacional dos Policiais Federais (Fenapef) e presidente do Sindicato dos Policiais Federais em Brasília.
O presidente da Associação dos Peritos Criminais Federais (APCF), Carlos Antônio de Oliveira, também acredita na possibilidade de vazamentos. Entretanto, ele acha importante o que o Ministério da Justiça “compartimente” a informação a fim de isso não acontecer. Werneck ainda se queixa dos pedidos de autorização para manter policiais no exterior. “Em 60 dias você não consegue levantar dados. Aí, você tem um mapeamento de quantos policiais estão em cada local”.
Mesmo descartado o medo dos monitoramentos indiretos, os policiais anteveem o adiamento forçado de operações por conta da burocracia, já que a corporação teria conseguido travar as despesas com viagens, “a gasolina” do órgão. “A PF é movida por diárias, já que o efetivo é diminuto”, afirma Marcos Leôncio, o presidente reeleito da ADPF. “A operação é a oportunidade. Então, traz prejuízo à operação se eu tenho que adiar tudo.”
A presidente do sindicato dos servidores técnico-administrativos da PF (Sinpecpf), Leilane Ribeiro, diz que a restrição às diárias é mais intensa para esse setor da corporação, que inclui desde agentes administrativos a médicos, engenheiros, arquitetos e contadores. “A partir de outubro, as diárias para os administrativos já estão suspensas até o fim do ano. Se houver necessidade, podem viajar com o risco de não receber a diária antecipadamente e de receber só no fim do ano”, denuncia Leilane.
Leilane diz que isso também atrapalha as grandes operações policiais. “É o administrativo que põe combustível no carro, que instala o equipamento, faz as ordens das missões, paga as passagens e instala os serviços de rádio”, enumera.