Otto Alencar foi candidato ao governo da Bahia sem nunca ter sido. Rui Costa foi candidato ao Senado por circunstâncias por ele criadas e deixou de ser. João Leão sentiu a caneta de governador nas mãos e a viu escapar pela falta de habilidade política daqueles que costuram - ou deveriam costurar - os arranjos partidários dentro da base aliada do governo da Bahia. Agora, quando o cenário de terra arrasada se aproxima, surge a utopia de que é viável apostar em Luiz Inácio Lula da Silva como cabo eleitoral para inflar uma candidatura que sequer foi alicerçada com antecedência. Foram dias intensos para quem acompanha a cena baiana.
O passo em falso primordial nasce com a sinalização de Jaques Wagner de que poderia não ser candidato ao governo, como se desenhava desde 2021. O ex-governador era um nome de consenso não apenas para o PT, mas para todos os partidos que compõem a base governista. Mas, ao menor sinal de desistência, Rui arvorou para si o legítimo direito de ser candidato a senador. A “aposentadoria” de muitos políticos estaria garantida e Lula endossaria sem sobressaltos, desde que houvesse um arranjo complementar bem orquestrado.
Daí surge a primeira aposta, com Otto como candidato a governador. O senador, todavia, disse, repetiu e foi enfático: queria a reeleição. Porém, diante de apelos de aliados, por pouco não aceitou mudar de roupa para as urnas. Experimentado como poucos, Otto fez construir uma condição que acabaria inviabilizando o projeto: o apoio público dos partidos aliados. Não foi ele quem colocou o requisito, mas isso ficou implícito todo o tempo. No fundo, o senador sabia das dificuldades. Mas ninguém apostaria nesse jogo autocentrado do PT em ter candidatura própria a qualquer custo.
Sem consenso na base, Otto desistiu de tentar se candidatar ao governo mesmo antes de ter se acostumado com a ideia de ser candidato a governador. O efeito dominó foi que a tentativa de reeleição dele obrigou Rui a desistir da candidatura ao Senado - algo que o próprio rechaçou ao mesmo tempo em que alimentou. Fruto não apenas do desejo autêntico do senador em permanecer no Congresso, mas também pela falta de entendimento dentro do próprio PT quanto a uma candidatura do governador a senador. Todavia, ninguém vai admitir o quadro - da mesma maneira que será negado para quem quiser ouvir.
A outra consequência indireta foi o não cumprimento da promessa de que João Leão sentaria na cadeira de governador por 9 meses. Partiu de Rui o sinal de que caberia a Leão a transição e o vice fez todo o possível para viabilizar o acordo. Leão foi um dos únicos a endossar publicamente a candidatura de Otto ao governo. Só não contava que a palavra dada não estava escrita e, ao baixar a poeira, a caneta foi tomada antes mesmo de ser emprestada. Leão está enraivecido, com razão, mas não deixará transparecer isso ainda. Tanto quanto Otto, o vice sabe onde as corujas - e as cobras dormem.
Desse caldo difícil de compreender, coube ao petismo fazer surgir uma candidatura própria sem qualquer estruturação prévia e com o único objetivo de representar o grupo político no pleito. Três nomes, Luiz Caetano, Moema Gramacho e Jerônimo Rodrigues foram postos, enquanto ainda há uma corrente que tenta forçar Wagner a ser candidato. Das apostas citadas, não precisa muito esforço para a oposição desconstruir, mas aí é um papel dos adversários e não da imprensa. Nos bastidores, Caetano é quem desponta com certo grau de favoritismo por conseguir transitar nas duas alas criadas a partir desse racha entre os interesses de Wagner e de Rui. Sempre sob a aposta de que Lula será mágico em 2022 tal qual foi em 2006, quando a onda vermelha chegou ao Palácio de Ondina.
Os aliados não chegaram ser pegos de surpresa. Antes de Wagner tornar público o posicionamento do grupo, todos foram informados. A maioria deles seguiu incrédula, de que era possível tentar um coelho na cartola a essa altura do campeonato e com as fragorosas derrotas na prefeitura de Salvador em 2016 e 2020. O desastre é iminente. Só não vê quem não quer.