Por meio de uma ação judicial proposta na Comarca de Guaratinga, o funcionário público municipal Estevão Silva do Nascimento, professor da rede municipal de ensino, conseguiu o direito de sua redução de carga horária de trabalho, sem compensação de horário e sem prejuízo do seu salário, para cuidar de sua filha, menor de idade, portadora do Transtorno do Espectro Autista (TEA). Na última quinta-feira, dia 15/06, a Juíza da Primeira Vara da Justiça da Comarca de Guaratinga, Drª Silvana Fleury Curado, concedeu a Tutela de Urgência em favor do pedido proposto pelo professor. O advogado Dr° Leonardo Oliveira Varges foi o responsável pela ação inicial.
Na decisão, a Magistrada aduz que a pretensão de redução de jornada de trabalho, sem minoração da remuneração ou necessidade de compensação das horas não trabalhadas, em razão de a parte possuir filha portadora de necessidades especiais, físicas e/ou mentais, que exigem tratamento multidisciplinar complexo, tem sustentação nos princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana, da proteção à família, dos valores sociais do trabalho e da promoção do bem-estar social, e, de forma mais especifica, da proteção integral à criança, os quais prevalecem sobre o princípio da legalidade. Além disso, considera-se ainda que a proteção legal é dirigida à criança e não ao trabalhador.
De acordo com laudos médicos apresentados na ação, para que tenha um desenvolvimento adequado, a menina precisa de cuidados diários e rotineiros, além de tratamentos e terapias específicas ao caso, os quais o município de Guaratinga não dispõe, tendo os pais que se deslocarem para outras cidades em busca do atendimento especial da mesma.
“Muitas pessoas podem pensar que é uma vantagem, mas não é. Trata-se do reconhecimento de um direito. Tentei por pelo menos duas vezes pelas vias administrativas, mas não fui atendido. Tive que recorrer à Justiça e ela por sua vez, fez sua parte, no que diz respeito a promover o desenvolvimento da criança, dando apoio para que eu possa acompanhar o tratamento da minha filha”, destaca Estevão, pai da criança.
O advogado Dr. Leonardo Oliveira Vargens (OAB:BA29178) foi o responsável pela ação inicial. De acordo com ele, a Lei 13.370/2016 concedeu aos servidores públicos federais o direito à redução do horário de trabalho sem redução dos vencimentos. Isso caso possuam cônjuge, filhos ou dependentes com deficiência. Apesar de a lei falar em redução para servidores públicos federais, esse mesmo direito se estende a servidores estaduais e municipais, conforme decisão do Supremo Tribunal Federal no Recurso Extraordinário 1237867. Muitos Estados e Municípios já reconheceram o direito através de leis próprias, mas, para quem não tem previsão legal, a legislação federal pode ser utilizada por analogia.
O QUE DIZ O ADVOGADO
De acordo com o Dr. Leonardo Varges “A redução de jornada sem compensação de horário e sem prejuízo de vencimentos trata-se de um direito que precisa ser melhor conhecido pelo servidor público e compreendido por toda a sociedade como medida de justiça social, solidariedade e de respeito à dignidade da pessoa do dependente e de seus familiares.
Ao mesmo tempo que visa proteger e atender as mais variadas necessidades da pessoa portadora de deficiência (tratamento à saúde, cuidados da vida diária etc.), por outro lado, tal direito também se destina aos familiares do dependente, de modo a assegurar o convívio familiar, o bem-estar da família e a efetiva participação e acompanhamento do tratamento clínico e necessidades especiais do dependente.
Portanto, cabe aos três poderes públicos (Executivo, Legislativo e Judiciário) o dever de garantir à pessoa com transtorno do espectro autista e seus familiares, atenção especial, pronto atendimento e prioridade na satisfação das suas necessidades especiais e proteção contra qualquer forma de abuso, preconceito, negligência e marginalização.
E esse caso decidido pelo Poder Judiciário em Guaratinga tem uma particularidade a destacar: o servidor público municipal poderá cumprir a sua jornada reduzida na sede do Município, ou seja, no local onde reside com a sua filha portadora de deficiência, sem a necessidade de cumprir parte da sua jornada em tempo integral no distrito onde lecionava.”
Após a notificação, o Município terá o prazo de 30 dias para que proceda a redução de jornada de trabalho do servidor pai da filha com Transtorno do Espectro Autista, em 50%, para fins de acompanhamento do tratamento, sem necessidade de compensação ou prejuízo de seus vencimentos atuais, para que possa se dedicar aos cuidados da filha com necessidades especiais, sob pena de multa diária de mil reais por descumprimento da decisão.
O processo tramita em segredo de justiça. O município pode recorrer da decisão.